O QUE É XAMANISMO?

Apesar do conceito de xamanismo ser muito estudado na atualidade, ele é de certa forma, incompreendido pelas pessoas de modo geral. À primeira vista, quando falamos em xamanismo, tomamos como referência os pajés nas tribos nativas. Mas o termo não se refere apenas às culturas indígenas americanas, mas a um conjunto de crenças ancestrais, que mesclam diversas heranças. A prática xamânica é uma conjuntura que compõe todas as práticas ancestrais que mantêm relação com o sagrado, divindades, espíritos e estados de consciência. Portanto, ela não se refere a um determinado povo ou cultura.

O termo foi cunhado por antropólogos, em adaptação da fonética siberiana que designa o xamã como “aquele que se comunica com os espíritos”. As raízes do termo são arcaicas e alguns antropólogos acreditam que elas recuam tão longe quanto a própria consciência humana, tendo origem há 40.000 ou 50.000 anos, na idade da pedra. O xamanismo é objeto de estudos em vários continentes e seus traços são percebidos em diversas religiões.

O xamanismo deve ser visto como um fenômeno em constante transformação e que, mais recentemente, se expandiu para as cidades. Assim, os estudos dividem o tema em xamanismo arcaico (clássico) e o xamanismo urbano (também chamado de “neo-xamanismo”). O xamanismo, de modo geral, relaciona-se a vários campos, através de ritos e processos de cura.

Em sua origem, o xamanismo tem como sacerdote o xamã, que é um indivíduo que faz o intermédio entre sua comunidade e o mundo espiritual. Ao xamã é atribuída a competência de curar, operar milagres e realizar feitos ditos impossíveis. É ainda um poeta, sacerdote e místico. Dentro das tradições xamânicas, o xamã passa por um despertar, que pode variar em três caminhos: “transmissão hereditária, vocação espontânea e vontade própria”. Esse despertar é manifestado por uma crise, uma ruptura provisória do equilíbrio espiritual do futuro xamã. A iniciação dá-se pela cura e pelo poder de auto-cura. O processo de iniciação é árduo e tem como objetivo fazer esquecer a vida passada (em um processo simbólico de morte e ressurreição). Finalizado o processo, ele passa a ser visto pela comunidade como uma alma do outro mundo. Ele adquire a habilidade de explorar o mundo espiritual conscientemente, realizando assim seu trabalho.

O xamã adquire também uma linguagem para se comunicar com os espíritos, inclusive os espíritos dos animais. A linguagem é aprendida através de um mestre ou por meios próprios, diretamente com os espíritos. Aprender a linguagem dos animais simboliza conhecer os segredos da natureza. Simboliza ainda a abertura de um portal com o mundo espiritual. Com um animal o xamã pode ir a lugares onde somente os espíritos dos mortos têm acesso. O xamã pode ser classificado, então, como um líder, possuidor de um dom sobrenatural, qualidade que lhe dá intuição e poder para dirigir diversas práticas religiosas. Ele atende às necessidades psicológicas e espirituais de sua comunidade. Ele é visto como alguém que pode restabelecer o contato entre domínios separados, como o profano e o sagrado, a saúde e a doença, o conhecido e desconhecido, o agressor e o ofendido, o natural e o sobrenatural. Ele exerce a função de mediador com o mundo invisível, visando restabelecer o equilíbrio.

O papel do xamã não é um fenômeno homogêneo, mas um que está em construção contínua, dependente das ações dos sujeitos sociais em contextos particulares. O xamanismo deve ser visto, portanto, como um fenômeno constantemente em mudança, que emerge das interações entre fatores sociais, culturais, históricos e demográficos em situações específicas. O xamanismo não conhece fronteiras, nem nacionais, nem tribais.

Mas apesar da diversidade, um elemento que consideramos comum entre os xamãs é a arte de entrar em estado alterado de consciência – mais recentemente chamado de estados ampliados de consciência – habilidade tipicamente ligada à jornada xamânica. Nesses estados, também chamados de estados de êxtase, os xamãs têm propriedade para viajar entre as zonas cósmicas (céu, terra e inferno). Nessas viagens os xamãs reconstituem e harmonizam o meio em que habitam.

No xamanismo sul-americano, a ferramenta mais conhecida para entrar nesses estados ampliados de consciência foi e é a ayahuasca, utilizada por diversas tribos localizadas na floresta amazônica. Seu uso varia de acordo com cada cultura específica, podendo ser para adivinhações, para criar arte através das visões, para encontrar a caça na floresta, para ter contato com antepassados, receber ensinamentos dos espíritos e também para cura de diferentes males. O uso da ayahuasca como técnica xamânica faz parte do complexo mítico religioso dos índios localizados na Amazônia brasileira, boliviana, peruana e colombiana. Suas práticas de xamanismo envolvem complexos rituais assentados em sólido conhecimento de plantas mágico-medicinais, em técnicas de contato com os espíritos dos mortos e com espíritos da natureza, retirando desse conjunto de conhecimentos um saber capaz de auxiliar na cura e na resolução de problemas pessoais e coletivos.

Mesmo com a impiedade da colonização, com os maus tratos, escravização, aculturação e massacre, esses conhecimentos se preservaram de tal modo que, o consumo da ayahuasca para fins religiosos se propagou de um centro cultural, cuja disseminação abrange particularmente a Amazônia, para os centros urbanos, através das trocas culturais ali estabelecidas.

Assim no Brasil, em particular, o tipo de xamanismo que ganhou visibilidade no cenário religioso, a partir de 1930 é o que se denomina ‘xamanismo-ayahuasqueiro’, pois ele remonta a grande tradição de consumo ritual da ayahuasca. O encontro entre índios e seringueiros, resultou na assimilação de elementos básicos da cosmologia indígena, entre eles o uso de psicoativos como propiciadores das experiências de contato com o sagrado.

O prolongamento do uso da ayahuasca para os centros urbanos aconteceu inicialmente em Rio Branco com Raimundo Irineu Serra, que dedicou sua vida à organização do culto e à sua trajetória de curador. Mestre Irineu, como é respeitosamente chamado, deu início então à formação do que se tem chamado de xamanismo urbano. Os estudiosos não vêm o xamanismo urbano (neo-xamanismo) como uma atualização, modernização ou transposição para a sociedade ocidental dessas práticas indígenas, mas sim como uma nova construção, em cujo processo de elaboração entra elementos e traços tanto do referencial indígena como de outras vertentes.

Esse “novo neo-xamanismo” tem, como elemento central, um conjunto de operações que se propõe a estabelecer (ou restabelecer) a ligação entre domínios que, por alguma razão, encontram-se separados. No xamanismo urbano, essa função não é atribuída ou encomendada a um especialista, todos podem exercê-la. A experiência do sagrado acontece na individualidade, cabendo a cada um percorrer os diversos planos de sua vida interior, buscar a harmonia e estabelecer o contanto entre seu ‘eu básico’ e seu ‘eu superior’. Assim o xamanismo é visto como uma espécie de patrimônio universal da humanidade.

Esse xamanismo é universalista, não se atendo a uma vertente ou expressão religiosa, mas utilizando métodos e práticas de diferentes vertentes para a busca do autoconhecimento. Aliás, essa é uma das principais características do xamanismo atual e que o distingue das versões tradicionais: a busca do aprimoramento do eu por meio de técnicas que levam ao autoconhecimento, ao desenvolvimento das potencialidades pessoais e à auto-cura.

Nesse xamanismo, os perigos não advêm dos outros, mas do interior de cada um e a prosperidade que se almeja dependerá do conhecimento das próprias potencialidades ou da correção dos distúrbios internos. Assim, o xamanismo é entendido como uma capacidade à disposição de todos, com a qual é possível despertar e se desenvolver. A capacidade xamânica é um atributo de cada um, os ritos, as técnicas, e os exercícios desenvolvidos nas diferentes linhas são considerados meios suficientes e capazes de modificar a direção de fluxos internos, de transmutar o peso de eventos traumáticos, de redirecionar pulsões negativas e de atingir os recônditos da subjetividade.

Buscar o xamanismo como expressão religiosa é um ato de busca da ancestralidade, por ser uma das mais antigas maneiras de se relacionar com o sagrado. Ele é considerado, portanto, um sistema de conhecimento espiritual, onde, no Brasil, sua prática esta associada principalmente ao uso da ayahuasca.

No entanto, mesmo dentro dessa denominação, existem muitas diferenças quanto ao método, objetivos e ferramentas que são utilizadas para alcançá-lo. Não é difícil encontrar centros denominados xamânicos que utilizam não somente da ayahuasca, mas de outras ‘plantas de poder’ que originalmente são utilizadas por tribos indígenas, em seu contexto cultural específico. Não é raro também centros que incentivam a vinda de nativos para aplicar essas diferentes ‘medicinas’ e realizar rituais com ayahuasca nos centros urbanos. Essas práticas configuram, ao ver do Instituto Xamânico Morada das Andorinhas, um forte desvio dos propósitos espirituais, tanto dos nativos, quanto dos centros ayahuasqueiros que dela fazem uso, trabalhando inclusive fora da legislação permitida pelo CONAD. O que configura, na prática, em crime.

A saber, no Brasil, só é permitido o uso de ayahuasca nos centros urbanos. Aqui no Instituto Xamânico Morada das Andorinhas, utilizamos apenas ayahuasca e o tabaco. Prezamos pelo estreito cumprimento das normas estabelecidas pelo CONAD, não prometemos nem realizamos nenhuma prática de curandeirismo, nem a utilização de qualquer outra ‘planta de poder’. Não incentivamos, nem participamos o comércio da ayahuasca e nem a utilizamos com outras drogas. Aliás, temos um firme compromisso em auxiliar aqueles que querem despertar para a vida a deixar seus vícios para trás. Portanto, o xamanismo ao qual fazemos parte, se caracteriza como um xamanismo específico de nossa região, onde somente a ayahuasca e o tabaco são utilizados. Além disso, realizamos o ritual de maneira disciplinada, prezando pelo silêncio, não movimentação, firmeza e estreito respeito a ordem. Separamos homens de mulheres e nossas danças ocorrem dentro da disciplina, sem excessos.

Dizemos que o xamanismo que praticamos tem como objetivos básicos: Através da meditação, reconectar o ser com sua sabedoria interior, conexão com a multidimensionalidade do ser humano, ancoragem do poder pessoal, conexão com seres espirituais, limpeza dos corpos físico e sutil, limpeza e harmonização de ambientes, harmonização plena do ser, conscientização do aspecto espiritual de cada um e de sua inter-relação com a natureza e com o planeta ao que pertence, ativação das habilidades de coragem, força e sabedoria para lidar com questões generalizadas, auto-curas e prevenção de distúrbios e doenças.

O conceito básico da cura xamânica é que “Ninguém cura o outro. A cura está dentro de cada um”.

DESPERTE!

XAMANISMO = UNIVERSALISMO

QUEM VIER, DE ONDE VIER, QUE VENHA EM PAZ E SERÁ BEM VINDO!